quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Quem quer que esteja presente é a pessoa certa para estar.

Seja quando for que comecemos é sempre o tempo certo.

O que acontece é a única coisa que poderia ter acontecido.

Quando acaba, acaba.

Harrison Owen.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Interpreto como Maturidade


Trecho de uma das cartas de Fernando Sabino para Clarice Lispector,

comentando um conto dela:

"Por ele posso perceber uma coisa muito mais importante do que a própria importância do conto: que você está escrevendo bem, com calma, estilo seguro, sem precipitação. Talvez porque agora você já não esteja sofrendo muito, mas sofrendo bem: é uma diferença bem importante, para a qual o Mário (de Andrade) sempre me chamava a atenção. A gente sofre muito: o que é preciso é sofrer bem, com discernimento, com classe, com serenidade de quem já é iniciado no sofrimento. Não para tirar dele uma compensação, mas um reflexo. É o reflexo disso que vejo no seu conto, você procura  escrever bem e escreve bem."

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Meu querido Artur da Távola

Onze de maio. Manhã luminosa de domingo. Fosse num domingo passado e eu estaria me preparando para encontrar-me com você no programa "Quem tem medo de música clássica", na TV Senado, altar onde adoro meus deuses. Você era o sacerdote, era música. Você sorria e convidava as crianças a se assentar e ouvir. Você era um me
stre bondoso. Alguns pensam que música clássica é coisa para adultos esnobes. Você, ao contrário, sabia que até as crianças gostam dela. Num dos seus programas, você revelou que era ainda criança quando pela primeira vez a música clássica o assombrou -foi a "Rapsódia Húngara nº 2", de Liszt. E, desde então, você não parou mais de se assombrar. Faz alguns domingos você já estava diante do "Grande Mistério", fiquei sabendo depois. O programa foi a repetição de um programa antigo. Lá estava você cheio de vida exercendo a função que mais amava, a de mestre de música clássica. Você acreditava que a música clássica, além de nos dar a alegria da beleza, tinha também o poder de produzir a bondade. Ouvindo música, a alma fica mais mansa. E você sorria aquele sorriso aberto ao explicar as coisas mais simples, o fagote, o pífaro, as cordas, o contraponto. Mais que uma experiência estética, era uma magia:você ficava inteiro possuído pela música, o que aparecia evidente no seu rosto, nos seus olhos -que vagavam pelo espaço à procura de palavras para dizer o indizível. O seu coração estava cansado. Não conseguia bater com forças próprias. Então você, numa decisão de feiticeiro, escolheu a 5ª Sinfonia de Beethoven. Ah! A 5ª Sinfonia, que se inicia com aqueles quatro acordes tremendos. Os entendidos dizem que esses quatro acordes são o "destino que bate à porta". De fato, naquele momento o destino estava batendo à sua porta... Talvez você imaginasse que o seu coração poderia ser ressuscitado pela força daqueles quatro acordes de força insuperável. E, depois dos quatro acordes, o coração se enchia de vida, a música se acelerava, corria, galopava... Foi assim que eu sempre o vi: corpo e alma identificados com a beleza da música. Mas os olhos não vêem a mesma coisa. William Blake, num aforismo, disse que "o tolo não vê a mesma árvore que o sábio vê". E Bernardo Soares explica por que: "O que vemos não é o que vemos, é o que somos". Eu o vi com o que sou, olhos de quem ama a música. Mas alguns o vêem com olhos diferentes, também verdadeiros, e você aparece então como político integro, crítico de televisão, jornalista. Li com atenção o material que a Folha lhe dedicou (10 de maio, A-14). Não sei se você, de onde está, o leu também. Eu o procurei no meio das palavras. Sabe que a palavra "música" não aparece mencionada nem uma vez? Achei isso um esquecimento lamentável. Eles se lembraram do que você era como guerreiro, sempre em luta pela justiça. O que é muito bom. Mas se esqueceram de que, na sua utopia, a única função da política é abrir espaço para a beleza. Quanto a mim, eu me lembrarei sempre de você sorridente e feliz ao final do programa, quando você dava sua última lição, como se fosse um mantra ao final de uma liturgia sagrada: "Música é vida interior. E quem tem vida interior jamais padecerá de solidão"

 

Autor: Rubem Alves

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

CANÇÃO DA TARDE NO CAMPO

Cecília Meireles

Caminho do campo verde,
estrada depois de estrada.
Cercas de flores, palmeiras,
serra azul, água calada.

(Eu ando sozinha
no meio do vale.
Mas a tarde é minha.)

Meus pés vão pisando a terra
que é a imagem da minha vida:
tão vazia, mas tão bela,
tão certa, mas tão perdida!

(Eu ando sozinha
por cima de pedras.
Mas a flor é minha.)

Os meus passos no caminho
são como os passos da lua:
vou chegando, vais fugindo
minha alma é a sombra da tua.

(Eu ando sozinha
por dentro de bosques.
Mas a fonte é minha.)

De tanto olhar para longe,
não vejo o que passa perto.
Subo monte, desço monte,
meu peito é puro deserto.

(Eu ando sozinha,
ao longo da noite.
Mas a estrela é minha.)

Cecília Meireles

domingo, 2 de setembro de 2012

“Tudo está em deixar amadurecer e então dar a luz.Deixar cada impressão, cada semente de um sentimento germinar por completo dentro de si.
Na escuridão do indizível, do inconsciente, em um ponto inalcançável do próprio entendimento e esperar com profunda humildade e paciência, a hora do nascimento de uma nova clareza.
Isso se chama viver artisticamente.
Tanto na compreensão, quanto na criação.
Não há nenhuma medida de tempo para quem faz arte. Um ano de nada vale e mesmo 10 anos não são nada. Ser artista significa não calcular, nem contar. Significa amadurecer como uma árvore que não apressa a sua seiva e permanece confiante durante as tempestades da primavera, sem o temor de que o verão possa não vir.
O verão vem, o verão vem!…
Mas só chega para os pacientes.
Para os que estão ali como se a eternidade se encontrasse diante deles com toda amplidão, com toda serenidade, sem preocupação alguma.
Aprendo isso diariamente. Aprendo em meio às dores as quais sou grato.
A paciência é tudo!”

Rainer Maria Rilke

domingo, 12 de agosto de 2012

Do Esquecimento e do Interesse

"Realmente, amo na mulher não aquilo que ela é por si mesma, mas a maneira como se aproxima de mim, aquilo que ela representa pra mim."

... e a medida que os anos passavam, já sentia quase medo de revê-la, pois sabia que nos encontraríamos num lugar em que Lucie não seria mais Lucie e que eu não teria mais como reatar o fio. Não quero dizer com isso que havia deixado de amá-la, que a esquecera, que sua imagem desbotara; ao contrário; ela morava em mim dia e noite, como uma silenciosa nostalgia;

E como Lucie se tornara para mim um passado definitivo (que na condição de passado vive sempre e como presente está morto), lentamente ela perdia para mim sua aparência carnal, material, concreta, para cada vez mais se desfazer em lenda, em mito escrito sobre pergaminho e escondido numa caixa de metal depositada no fundo da minha vida.

Talvez por isso mesmo o impensável se tornara possível: minha incerteza diante de seu rosto, na cadeira do cabeleireiro. Por isso ainda, nessa manhã tive a impressão de que o encontro não fora real; que ele também deveria ter se desenrolado no nível de lenda, de oráculo ou de adivinhação. Se ontem à noite a presença real de Lucie me perturbou, transportando-me subitamente para o tempo distante em que ela reinava, nesta manhã de sábado eu apenas me perguntei, com o coração tranqüilo repousado pelo sono): por que a reencontrei? O que significa esse acaso? O que ele tem a me dizer?

As histórias pessoais, além de acontecerem, também significam alguma coisa? Apesar de todo o meu ceticismo, sobrou-me um pouco de superstição irracional, como a curiosa convicção de que todo acontecimento que me sucede comporta também um sentido, que ele significa alguma coisa; que por sua própria aventura a vida nos fala, nos revela gradualmente um segredo, que se oferece como um enigma a ser decifrado, que as histórias que vivemos formam ao mesmo tempo a mitologia de nossa vida e que essa mitologia detém a chave da verdade e do mistério. É uma ilusão? É possível, é mesmo verossímil, mas não posso reprimir essa necessidade de decifrar continuamente minha própria vida.

... O encontro de ontem com Lucie tinha, afinal de contas, apagado e sufocado meu interesse por Helena, que fora tão intenso poucos dias antes. Esse interesse, agora, era apenas a lembrança de um interesse; apenas um sentimento de dever em relação a um interesse perdido.

Trechos de "A Brincadeira" - Milan Kundera

sábado, 11 de agosto de 2012

Eu sei que me deparo com algumas situações na vida, oportunidades, que eu me sentiria covarde senão topasse!
"Todas as situações capitais da vida acontecem uma vez, são sem retorno." Milan Kundera.

"Será que se pode mudar toda uma atitude diante da vida pela úncia razão de se ter sido injustiçado?"

"(Dava a impressão de escolher um vocabulário com duplo sentido, prática tão  ridícula quanto animadora.)"

Do Imaginário

"Sempre imagino minha mãe no céu. Não, não creio mais em Deus, na vida eterna, nem em coisas semelhantes. Não se trata de fé. Trata-se do imaginário. Não sei por que deveria abandoná-lo. Sem isso, me sentiria órfão. Vlasta me censura por ser sonhador. Parece que não vejo as coias como elas são. Absolutamente; eu as vejo como elas são, mas, além das coisas visíveis, vejo outras coisas. Não é a toa que existe o imaginário. É dele que é tecido o nosso mundo interior."

A Brincadeira - Milan Kundera

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Pertencer


Um amigo meu, médico, assegurou-me que desde o berço a criança sente o ambiente, a criança quer: nela o ser humano, no berço mesmo, já começou.

Tenho certeza de que no berço a minha primeira vontade foi a de pertencer. Por motivos que aqui não importam, eu de algum modo devia estar sentindo que não pertencia a nada e a ninguém. Nasci de graça.

Se no berço experimentei esta fome humana, ela continua a me acompanhar pela vida afora, como se fosse um destino. A ponto de meu coração se contrair de inveja e desejo quando vejo uma freira: ela pertence a Deus.

Exatamente porque é tão forte em mim a fome de me dar a algo ou a alguém, é que me tornei bastante arisca: tenho medo de revelar de quanto preciso e de como sou pobre. Sou, sim. Muito pobre. Só tenho um corpo e uma alma. E preciso de mais do que isso.

Com o tempo, sobretudo os últimos anos, perdi o jeito de ser gente. Não sei mais como se é. E uma espécie toda nova de "solidão de não pertencer" começou a me invadir como heras num muro.

Se meu desejo mais antigo é o de pertencer, por que então nunca fiz parte de clubes ou de associações? Porque não é isso que eu chamo de pertencer. O que eu queria, e não posso, é por exemplo que tudo o que me viesse de bom de dentro de mim eu pudesse dar àquilo que eu pertenço. Mesmo minhas alegrias, como são solitárias às vezes. E uma alegria solitária pode se tornar patética. É como ficar com um presente todo embrulhado em papel enfeitado de presente nas mãos - e não ter a quem dizer: tome, é seu, abra-o! Não querendo me ver em situações patéticas e, por uma espécie de contenção, evitando o tom de tragédia, raramente embrulho com papel de presente os meus sentimentos.

Pertencer não vem apenas de ser fraca e precisar unir-se a algo ou a alguém mais forte. Muitas vezes a vontade intensa de pertencer vem em mim de minha própria força - eu quero pertencer para que minha força não seja inútil e fortifique uma pessoa ou uma coisa.

Quase consigo me visualizar no berço, quase consigo reproduzir em mim a vaga e no entanto premente sensação de precisar pertencer. Por motivos que nem minha mãe nem meu pai podiam controlar, eu nasci e fiquei apenas: nascida.

No entanto fui preparada para ser dada à luz de um modo tão bonito. Minha mãe já estava doente, e, por uma superstição bastante espalhada, acreditava-se que ter um filho curava uma mulher de uma doença. Então fui deliberadamente criada: com amor e esperança. Só que não curei minha mãe. E sinto até hoje essa carga de culpa: fizeram-me para uma missão determinada e eu falhei. Como se contassem comigo nas trincheiras de uma guerra e eu tivesse desertado. Sei que meus pais me perdoaram por eu ter nascido em vão e tê-los traído na grande esperança.

Mas eu, eu não me perdôo. Quereria que simplesmente se tivesse feito um milagre: eu nascer e curar minha mãe. Então, sim: eu teria pertencido a meu pai e a minha mãe. Eu nem podia confiar a alguém essa espécie de solidão de não pertencer porque, como desertor, eu tinha o segredo da fuga que por vergonha não podia ser conhecido.

A vida me fez de vez em quando pertencer, como se fosse para me dar a medida do que eu perco não pertencendo. E então eu soube: pertencer é viver. Experimentei-o com a sede de quem está no deserto e bebe sôfrego os últimos goles de água de um cantil. E depois a sede volta e é no deserto mesmo que caminho!

Clarice Lispector

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.

Clarice Lispector

Aos babacas

Há uma certa espécie de homem, desses que se acham e enchem a boca pra falar que abrem a porta do carro pra mulher, to dispensando!

Eu posso muito bem abrir a porta do carro, tenho braços fortes e sou capaz!

Agora se você homem dessa espécie quer ser gentil, então comporte-se dessa forma ao papel inteiro, pague a conta do restaurante, pegue a garota em casa ao sairem juntos e ligue no dia seguinte. Agora o mais importante mesmo é seja amável, tenha consideração e saiba como tratar uma mulher especial do começo ao fim.

domingo, 5 de agosto de 2012

Da motivação

Dessa noite em diante, tudo em mim se transformou; tornei-me de novo habilitado; de repente uma arrumação foi feita em mim, como num quarto, e alguém vivia ali. O relógio da parede, com os ponteiros parados havia muitos meses, repentinamente fazia ouvir de novo o seu tique-taque. Isso era importante: o tempo, que até então passara como uma corrente indiferente, do nada em direção a outro nada (já que eu estava numa pausa!), sem ponto de referência, sem medida, pouco a pouco readquiria sua aparência humanizada: recomeçava a se articular e a se contar regressivamente. Subitamente passei a dar valor às licenças para deixar o quartel, e os dias se tornaram degraus de uma escada que eu subia para encontrar Lucie.

A Brincadeira - Milan Kundera

Do Quem Sou Eu?

"Mas quem era eu de fato? Sou obrigado a repetir: eu era aquele que tinha muitas caras.

Durante as reuniões, era sério, entusiasta e convicto; desenvolto e provocador em companhia dos colegas; laboriosamente cínico e sofisticado com Marketa; e, quando estava só (quando pensava em Marketa), era humilde e encabulado como um colegial.

Essa última cara seria a verdadeira?

Não. Todas eram verdaderiras: eu não tinha, a exemplo dos hipócritas, uma cara autêntica e outras falsas. Tinha muitas caras porque era moço e porque não sabia eu mesmo quem era e quem queria ser. (No entanto, a desproporção existente entre todas essas caras me dava medo; a nenhuma delas aderia por completo e por trás delas evoluía desajeitado, às cegas.)

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DA IMAGEM

Comecei a compreender que não havia nenhum meio de retificar a imagem da minha pessoa, desqualificada por um tribunal supremo dos destinos humanos; compreendi que essa imagem (por menos que se parecesse comigo) era infinitamente mais real do que eu mesmo; que ela não era de maneira alguma minha sombra, mas que eu é que era a sombra da minha imagem; que não era possível acusá-la de não se parecer comigo, mas que era eu o culpado dessa falta de semelhança; e que essa falta de semelhança, enfim era minha cruz, uma cruz que eu não poderia passar a ninguém e que estava condenado a carregar.

Não obstante, não quis recapitular. Quis realmente carregar minha dessemelhança: continuava a ser aquele que haviam decidido que eu não era.

A Brincadeira - Milan Kundera
Naqueles dias de conversar bobagem, chego na minha mãe e falo:

- Mãe porque você me pôs no mundo, só pra sofrer...

Quando minha irmã responde:

- Mas foi você que foi lá e foi o espermatozóide mais rápido.

Quem mandou? (risos) =/ 

domingo, 29 de julho de 2012

João, estou esperando a sua ligação...
João, será que é você que vai me tirar da solidão?

sábado, 19 de maio de 2012

Mais uma vez... Clarice Lispector...

E eis que em breve nos separaremos

E a verdade espantada é que eu sempre estive só de ti e não sabia
Eu agora sei, eu sou só
Eu e minha liberdade que não sei usar
Mas, eu assumo a minha solidão
Sou só, e tenho que viver uma certa glória íntima e silenciosa
Guardo teu nome em segredo
Preciso de segredos para viver
E eis que depois de uma tarde de quem sou eu
E de acordar a uma hora da madrugada em desespero
Eis que as três horas da madrugada, acordei e me encontrei
Fui ao encontro de mim, calma, alegre, plenitude sem fulminação
Simplesmente eu sou eu, e você é você
É lindo, é vasto, vai durar
Eu não sei muito bem o que vou fazer em seguida
Mas, por enquanto, olha pra mim e me ama
Não, tu olhas pra ti e te amas
É o que está certo
Eu sou antes, eu sou quase, eu sou nunca
E tudo isso ganhei ao deixar de te amar
Escuta! Eu te deixo ser… Deixa-me ser!

Se eu Fosse Eu - Clarice Lispector

"Quando não sei onde guardei um papel importante e a procura se revela inútil, pergunto-me: se eu fosse eu e tivesse um papel importante para guardar, que lugar escolheria? Às vezes dá certo. Mas muitas vezes fico tão pressionada pela frase "se eu fosse eu", que a procura do papel se torna secundária, e começo a pensar. Diria melhor, sentir.
E não me sinto bem. Experimente: se você fosse você, como seria e o que faria? Logo de início se sente um constrangimento: a mentira em que nos acomodamos acabou de ser levemente locomovida do lugar onde se acomodara. No entanto já li biografias de pessoas que de repente passavam a ser elas mesmas, e mudavam inteiramente de vida. Acho que se eu fosse realmente eu, os amigos não me cumprimentariam na rua porque até minha fisionomia teria mudado. Como? não sei.
Metade das coisas que eu faria se eu fosse eu, não posso contar. Acho, por exemplo, que por um certo motivo eu terminaria presa na cadeia. E se eu fosse eu daria tudo o que é meu, e confiaria o futuro ao futuro.
"Se eu fosse eu" parece representar o nosso maior perigo de viver, parece a entrada nova no desconhecido. No entanto tenho a intuição de que, passadas as primeiras chamadas loucuras da festa que seria, teríamos enfim a experiência do mundo. Bem sei, experimentaríamos enfim em pleno a dor do mundo. E a nossa dor, aquela que aprendemos a não sentir. Mas também seríamos por vezes tomados de um êxtase de alegria pura e legítima que mal posso adivinhar. Não, acho que já estou de algum modo adivinhando porque me senti sorrindo e também senti uma espécie de pudor que se tem diante do que é grande demais".
(Texto extraído do livro A Descoberta do Mundo, Clarice Lispector, editora Rocco, pg. 156).

Loucos e santos - Oscar Wilde

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. 
Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. 
A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. 
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. 
Deles não quero resposta, quero meu avesso. 
Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim. 
Para isso, só sendo louco. 
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças. 
Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. 
Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. 
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. 
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. 
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos. 
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. 
Não quero amigos adultos nem chatos. 
Quero-os metade infância e outra metade velhice! 
Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. 
Tenho amigos para saber quem eu sou. 
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Closure... Estou Intolerante!

Não que essa mensagem vá fazer qualquer diferença, afinal como você mesmo me lembrou outro dia, o tempo cura tudo... e talvez daqui uma semana, isso tenha qualquer importância na minha vida... mas é um ritual... e eu gosto de rituais...



E não que eu já esperasse muita coisa, afinal a gente estava só se conhecendo, mas um mínimo de consideração eu esperava sim, uma conversa honesta do tipo, “você é legal, mas não vai rolar...”, poderia ter sido após o café da manhã na padaria! teria sido tão mais bonito...!



Porque é isso que meninos de bem fazem quando encontram uma garota legal!!!!!!!



Tudo hoje está bagunçado e generalizado, mas acho que devemos ter um mínimo de consideração e respeito pelas pessoas que passam por nossas vidas, (muito diferente de alguém que se encontra numa balada, e nem temos um contato de verdade) mas alguém que passou alguns bons momentos conosco, mesmo que poucos e passageiros! temos que dar mais valor... bom, mas isso é questão de valores!



Se você foi ensinado que deve buscar a garota em casa quando sai com ela, esqueceram de te ensinar como se trata essa garota depois de levá-la pra cama. Veja, eu não sou nada contra sexo casual, mas o fato de um cara “pagar de namoradinho”, ter um tipo de atitude antes e mudar complemente depois de levar a garota pra cama... e tratá-la como se ela fosse uma qualquer?

isso não combina nada com um menino de família!



Como você pôde perceber fiquei chateada sim... magoada... não tenho porque esconder... e decepcionada! Mas eu nem te conheço! Pois é... O que eu sei que as vezes a gente se chateia com alguém que não nos trata bem no dia a dia, no transito ou na esquina, quanto mais alguém com quem houve algum tipo de investimento, e de energia... e se abriu as portas da casa, e se pensou na possibilidade de abrir o coração e compartilhar coisas...







Sem mais,


Poema em linha reta



Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.



E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,

Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,

Indesculpavelmente sujo,

Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,

Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,

Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,

Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;

Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,

Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,

Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.



Toda a gente que eu conheço e que fala comigo

Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,

Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...



Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;

Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!

Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?

Ó príncipes, meus irmãos,



Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?



Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?



Poderão as mulheres não os terem amado,

Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!

E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?

Eu, que venho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.



Fernando Pessoa (Álvaro de Campos)

domingo, 22 de janeiro de 2012

Reality - just love it!

Meredith Grey (Grey’s Anatomy): “We all remember the bed time stories of our childhood. The shoe fit Cinderella, the frog was turned into a prince, sleeping beauty was awakened with a kiss. Once upon a time and then they lived happily ever after. Fairy tales. The stuff of dreams. the problem is, fairy tales don’t come true. It’s the other stories. The ones that start in dark and stormy nights and end in the unspeakable. The nightmares always seem to become the reality.”




Meredith Grey (Grey’s Anatomy): “Once upon a time, happier ever after. The stories we tell are the stuff of dreams. Fairy tales don’t come true. Reality is much stormier. Much murkier. Much scarier. Reality it’s so much more interesting than living happily ever after.”